Magnólia
Três histórias surpreendentes em que todas acontecem no Edifício Magnólia no Rio de Janeiro.
Autofagia virtual
Etéreo
Depois que voltei das férias este ano, tenho sentido constantemente a sensação de que minha alma tomou dúzias de latinhas de Red Bull ganhou asas e voou para bem longe daqui. O corpo ficou. Desnorteado, vagando lento, vagabundeando e zumbizando direções desordenadas, desgovernadas e intempestivas. Durmo muito tarde, e acordo muito tarde com a impressão que o tempo não passou. Sonhos abstratos e confusos. E minha cama parece me prender com todos os tentáculos possíveis e imagináveis, como que implorando que eu não a deixe. Mas eu preciso. Preciso sair do meu casulo e vagar no cinza do dia e na garoa da noite, fingindo esquecer tanta coisa. Preciso ir ao trabalho que não vejo significado a não ser que preciso pagar as contas. E preciso passar na farmácia para comprar uma caixa de Verotina para ver se consigo encontrar um pouco de graça na vida e se possível dormir um sono sem sonhos, porque os sonhos agem diretamente sobre o meu humor. Fico pensando horas e horas no meu sonho recorrente, quando no céu as nuvens formam as letras A e C. Que será isso? Nome de alguém? Um sinal? Daqueles que eu vivo pedindo pro papai do céu me mandar enquanto estiver dormindo? Será? Levanto, tomo água e fico de novo rolando na cama e pensando. Preciso encontrar um caminho alternativo para o trabalho para não ter que encontrar aquele demônio de cabelo roxo no caminho. E procurar logo um destino para viajar de novo. Mas o que eu queria mesmo era só voltar à superfície, ou que minha alma alada descesse novamente à minha órbita e trouxesse junto com ela, um pouco de juízo, para que eu não sentisse mais falta da minha mente. De repente minha alma faz uma visita ao meu corpo e tudo fica claro. As letras do sonho, escritas no céu não eram nomes de ninguém, era só um código: Acorda Criatura!
Impossível
Impossível pensar no mar e não imaginar solidão. Impossível sentir o cheiro de protetor solar e não lembrar Balneário Camboriú. Impossível pensar em jornalismo (meu sonho) e não lembrar da Aryane Canuto. Impossível pensar em abraço apertado e não lembrar do meu filho Ariel. Impossível ouvir Cássia Eller cantando Malandragem e não lembrar da Andrea Santana cantando bem alto no volante enquanto viajamos pela Rodovia dos Bandeirantes. Impossível ver um parapente no céu e não lembrar de São Vicente. Impossível pensar em inteligência e não lembrar do meu filho Caio. Impossível não falar em espiritismo e não lembrar da minha amiga mais amada Ana Vera. Impossível pensar em setembro e não lembrar de separação. Impossível pensar no Rio de Janeiro e não lembrar de aventura. Impossível andar pelo bairro da Liberdade e não lembrar dos meus amigos Cristóvão, Marcelo e Adriano. Impossível pensar em bagunça e não lembrar do Eduardo Croce. Impossível ouvir Kid Abelha e não lembrar da Amanda e das ruas do bairro de Pinheiros, nem do Hotel Filadélfia. Impossível ver uma tatuagem e não lembrar da Anne e seu jeito singular (...). Impossível ver um jardim cheio de flores e não pensar na minha avó. Impossível uma tarde de domingo chuvosa e não lembrar dos bolinhos de chuva da minha mãe. Impossível ouvir Christian e Ralf e não lembrar do meu primo Ricardo. Impossível chegar um 13 de fevereiro e não lembrar do meu amigo Valdivino e na saudade que ele deixou quando faleceu. Impossível chegar natal e não lembrar da árvore do Ibirapuera. Impossível chegar ano novo e não lembrar daquela virada de ano que eu ficava lendo O Senhor dos Anéis naquela casinha pequena que eu vivia com minha ex-mulher e nossa pequena árvore de natal com bolas prateadas. Impossível pensar em Judaísmo e não lembrar do Alberto Dwek. Impossível ver um careca na rua e não lembrar do meu amigo Luiz Roberto. Impossível ver os geoglifos lá de cima no avião e não lembrar de Brasília e da casa das minhas tias e de suas geladeiras cheias de iogurte. Impossível jogar Need for Speed e não lembrar do meu irmão Allisson. Impossível ouvir Marina Lima e não lembrar da Andréa Magalhães. Impossível sentir o cheiro de grama molhada e não pensar no meu avô. Impossível pensar em paciência e não me lembrar da minha avó Maria. Impossível comer gelatina e não lembrar da minha tia Eleusa. Impossível não pensar em mãe e filho e não lembrar da minha amiga Livia Mendonça. Impossível ver decoração japonesa e não pensar na minha sala. Impossível comer sanduíche do Subway e não lembrar da Rosana. Impossível ver uma Brasília amarela e não lembrar do meu tio Ezequias. Impossível ver uma mulher careca de lenço e câncer e não lembrar da minha amiga Mirian e na falta que ela me faz desde que se foi a quinze anos. Impossível pensar na Inglaterra e não lembrar da Marie Burke. Impossível ver uma lágrima e não lembrar das noites de dezembro. Impossível esquecer a saudade que tantos me fazem e na falta de tantos outros. Impossível esquecer. Impossível tentar viver sem lembrar. Impossível.
Momento Leila
Eu fiz questão de vir aqui dar o meu depoimento, porque eu já estou de saco cheio das pessoas ficarem criticando meu estilo de vida e as coisas que eu faço. Sabe, eu não tô nem aí pro que os outros pensam, eu acho que se todo mundo cuidar da sua própria vida, vai ser melhor pra todo mundo. Então se eu quiser apagar ou esconder as fotos do meu perfil, isso é problema meu. E se eu quiser mudar o status das minhas redes sociais, ninguém tem nada a ver com isso. Eu não preciso ficar escondendo quem eu sou pra agradar ninguém, eu sou assim e pronto, acabou. Nem preciso esconder se estou sozinho ou com alguém pros outros pararem de perguntar, não tô nem aí, eu quero mais é que os outros se danem. Afinal, a partir do momento que eu pago minhas contas e lavo minhas cuecas eu não devo satisfação pra seu ninguém. Mas uma coisa saibam de mim, eu sou que nem espelho, meu comportamento reflete o que eu recebo. Então não venham me rotular. Ou então rotule, afinal, que diferença isso vai fazer para mim se falarem bem ou mal? Outra coisa, assim como todo mundo minimamente são, minha prioridade sempre, SEMPRE, S.E.M.P.R.E. será eu. Não é filho, não é familia, não é namorada, ou que bicho for. E é por isso que eu não abro mão de ser quem eu sou, se gostou, gostou, se não gostou que se dane, vá à merda. Eu não vou mudar meu estilo de vida, eu tenho caráter e tenho personalidade, e sei muito bem quem eu sou. Esses dias vieram me perguntar por que eu apaguei as fotos do meu orkut. Bom, em primeiro lugar, tô nem aí pra opinião alheia, aliás quero que os alheios se fodam. Em segundo, apaguei porque tinha que apagar. Não gostei disso mas gostei menos ainda de saber que na relação de dois, só um tem a coragem de colocar a cara pra bater. Não foi por fulano, nem cicrano. Então é isso que eu tinha pra dizer. Se todo mundo fizer o que bem entender da sua própria vida, vai ser melhor pra todo mundo. Obrigado!