O Funk e a decadência brasileira

Uma crônica sobre o estilo musical que tomou conta do país.

A certeza imaginária

Uma reflexão sobre os comportamentos de quem encontrou a pessoa certa.

Magnólia

Três histórias surpreendentes em que todas acontecem no Edifício Magnólia no Rio de Janeiro.

Pais e Filhos

Um retrato de quem passou para a fase adulta sem esquecer dos valores de infância.

Dormindo com o inimigo

A violência contra a mulher é o tema principal deste artigo.

Pretérito imperfeito

Já que com a tecnologia avançada do jeito que está vou fazer algumas exigências: quero voltar da escola as 11h30 da manhã e assistir meu episódio inédito de Flashman por que logo depois vai passar Changeman e todo mundo vai vibrar quando eu contar, já que eu sou o que mora mais perto da escola e ninguém chegou a tempo de assistir, apenas eu. Depois quero passar na padaria e encher meus bolsos de chicletes Ping Pong e Ploc para pegar as figurinhas e fazer uma super tatuagem nova. Em seguida, vou chamar a minha prima para assistir o canal TVS (que hoje é o SBT) porque vai passar um super desenho do Kissyfur e não podemos perder. Quando chegar o final da tarde eu vou colocar o meu tênis Bamba azul e dar uma volta pelo bairro, me sentindo o maioral da turma, porque só eu tenho esse calçado, e com ele eu posso correr atrás de todos os pirocópteros da molecada da rua que estão por ali. Quando a noite cair, eu irei voltar pra casa e assistir aqueles episódios horríveis do Juca Chaves que passa na TVS antes de começar a Pantera Cor de Rosa e depois dormir para começar tudo outra vez no dia seguinte. Quando o dia amanhecer eu vou pra escola com o meu tênis Redley novinho que meu pai me deu de presente, e vou mostrar pra todo mundo que eu tenho um minigame novo, daqueles que ninguém ainda tem, e matar todo mundo de inveja, já que hoje terá uma apresentação da turma da Xuxa na escola e eu não posso faltar. Logo agora que minha mãe foi me levar e na ida comprou aquelas garrafinhas de Pepsi com tampa de metal e colocou na minha lancheira um sanduíche horrível, mas graças a Deus colocou no bolso da minha calça jeans uma nota de quinhentos cruzeiros pra eu comprar um lanche na cantina. Quando eu voltar da escola e meu pai que foi me buscar apertar tanto a minha mão a ponto de quase quebrar porque eu errei a tabuada de sete, minha mãe vai fazer bolinhos de chuva enquanto eu vejo um arco-íris se formar no céu, porque choveu muito e agora o mormaço está matando todo mundo de calor e esperar. Logo depois minha prima vai me ensinar como se faz sexo, coisa que eu só vou aprender muitos e muitos anos depois. Minha aula será no sofá da sala, enquanto minha avó fica pela cozinha fazendo alguma coisa pra comermos, porque ela com seu dom maternal e natural quer que fiquemos fortes e saudáveis. E agora que eu posso realizar tudo que quero com a ajuda da tecnologia, quero voltar a casa da minha tia em Brasília, onde meu pai vai me comprar uma pipa para eu e meu primo nos divertimos no dia seguinte, mas antes vou colocar uma carta no correio para aquela menina que eu amei e que mora longe, e esperar mais de uma semana pela resposta que virá num envelope personalizado e com as letras da carta manchadas do perfume dela e cheio de pedacinhos de flores que ela mandou pra mim.  E logo em seguida eu vou terminar esse texto saudosista e ver que me tornei adulto e que tudo aquilo que vivi, e fiz, foi apenas algo muito, mas muito comum. Coisa que hoje não existe mais. Ahh 1987! Saudades...

O funk e a decadência brasileira

O movimento funk é antigo, mas ainda me surpreende. Por onde quer que esteja é possível ver meninos, isso mesmo, meninos, muitos em corpo de homem ostentando suas correntes sejam douradas ou prateadas, os terríveis bonés que cobrem as orelhas e os já tradicionais braços cruzados com as mãos abertas debaixo das axilas, numa demonstração de “quem manda aqui sou eu”.
Viro uma esquina próxima da minha casa onde as meninas, se aglomeram próximas de um carro com o som em último volume, onde nas noites de sábado e domingo o “pancadão” rola solto, irritando vizinhos, evangélicos e caretas em geral. Mas elas não se incomodam, continuam rebolando suas curvas, muitas bem feitas, em shorts curtíssimos e calças apertadas com tanta força que parecem ter sido fechadas a vácuo, enquanto eles ainda estão na posição de senhorio, com roupas folgadas e tétricas, talvez num modo de esconder sua excitação por ver tantos movimentos lascivos do sexo oposto.
Entro no trem e as chances de haver ali alguém com o celular ligado tocando funk “proibidão” são de quase cem por cento. Pouco adianta olhar torto e fazer cara de poucos amigos para eles. O volume não irá abaixar, as pessoas ao redor continuarão desconfortáveis e minha leitura vai ter que esperar, já que é impossível se concentrar ouvindo os gemidos e sussurros insinuantes que saem dos alto-falantes dos aparelhos.
O estilo musical que começou nos Estados Unidos, ganhou o Brasil como uma maneira de expor toda a sensualidade que antes ficava dentro do armário e arrastou multidões. Seja pela letra apelativa com um palavreado completamente chulo, muitas vezes fazendo apologia à violência ou talvez apenas como um chamariz para o sexo completamente descompromissado com o maior número de pessoas que talvez eles mesmo sequer sabem o nome.
O funk rompe barreiras, mas ainda não venceu a maior de todas: a do preconceito. E parece ser isso que suas letras tentam combater. Mostrar que ser preconceituoso contra a ignorância alheia está fora de moda hoje. A alguns anos atrás conversando com um funkeiro  questionei o que ele dizia para uma menina que ele tivesse se interessado num dos pancadões que frequenta. Perguntei: “o que você diz depois de falar o seu nome”, ao que ele me respondeu “a gente não fala nada não, a gente já chega e pega logo”.
Chegamos talvez ao auge da degradação moral, à falta de valores, uma descida que parece não ter mais fim. Ao que me pergunto: o que é o funk proibido? Sexo explícito em alto-falantes e fones de ouvido, crime, cultura ou a falta dela?

A certeza imaginária

Você descobre que encontrou a pessoa certa, no exato momento em que acorda e o primeiro pensamento vai automático procurando por aquele nome que encontra o seu porque estão conectados de uma forma que não conseguimos explicar. Você tem certeza de que está no caminho certo, quando você não precisa esperar uma ligação que você sabe que chegará naquela fração de segundo em que você pensa e acontece. E no momento mágico do “alô” a voz que entra pelo ouvido causa reações químicas e sudorese intensa, as mãos tremem e tudo que antes doía, já não dói mais agora, porque o momento é por si só feliz. E os planos começam a se materializar mesmo que no apenas no pensamento, e começam a tomar forma no mundo das ideias, mas os segundos teimam em passar mais devagar, já que aquela pessoa está ali tão perto, mas o jeito é esperar. Mas é talvez a melhor das esperas, é aquela espera que se sabe que vai dar certo, que é a última espera. É a espera que teimamos em permanecer, quando tudo está praticamente ao alcance da mão, mas só resta aquela música que agora é tema dos dois, e a foto no porta retrato na cabeceira da cama, que recebe o carinho dos dedos, no primeiro movimento do dia. É a espera de quem dorme com o cheiro da pessoa amada no travesseiro, tentando fazer com que o cheiro traga a pessoa mais para perto, já que ali, no lado vazio da cama, está apenas a lembrança, junto com a certeza. A certeza insana e teimosa que só tem quem ama de verdade, a certeza que temos quando pensamos tanto, que é possível sentir o toque, a tez, a cor e o sabor de coisas que não aconteceram ainda. Ainda. E é nesse exato momento que descobrimos que todas as coisas vividas, todos os anos esperados foram apenas a base para algo muito, muito maior e melhor. E é nesse exato momento que descobrimos que tudo aquilo que foi sonhado, planejado e imaginado, era tudo verdade, que não era fruto de uma mente delirante. Era e é tudo real. Muito real.

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