O Funk e a decadência brasileira

Uma crônica sobre o estilo musical que tomou conta do país.

A certeza imaginária

Uma reflexão sobre os comportamentos de quem encontrou a pessoa certa.

Magnólia

Três histórias surpreendentes em que todas acontecem no Edifício Magnólia no Rio de Janeiro.

Pais e Filhos

Um retrato de quem passou para a fase adulta sem esquecer dos valores de infância.

Dormindo com o inimigo

A violência contra a mulher é o tema principal deste artigo.

Plug and Play

Depois da fase do relaxamento total veio a fase do stress total. Dormir no máximo 4 horas por noite, trânsito paulistano, metrô abarrotado. Gente xingando e se acotovelando em cada estação e por aí vai. Ligações chatas o tempo todo e tudo que se possa imaginar que nos torna cada dia mais felizes e animados. Mas o que eu mais queria era ter uma ferramenta, daquelas tipo plug e use que criasse uma barreira invisível de gente chata. Gente que enche o saco e tira o pouco de paciência que ainda resta. Uma ferramenta que a gente ligasse e todos os contatos pedantes do msn desaparecerem, recados indesejáveis de orkut serem automaticamente eliminados, os sinais de celular parassem de funcionar por um tempo, e os sistemas de internet finalmente funcionassem sem que eu tivesse que ficar esperando a boa vontade da máquina para funcionar. E que esticasse se possível um pouquinho mais a paciência para que eu terminasse de escrever essa crônica malfadada.

Preto e Branco

Era um daqueles dias que a gente parece acordar do lado errado da cama. O despertador tocando em algum lugar do quarto, a cabeça pesando uma tonelada e inevitavelmente aquela pontada aguda no fundo dos olhos, como um prêmio de consolação da noite anteior. E assim o dia nasce preto e branco, insípido, insosso, irreversível. Vontade de ficar ali mesmo na cama, apenas olhando para a frestinha aberta da janela do quarto, enquanto o mundo que se dane lá fora. Mas daí tudo começa. O metrô lotado, os ponteiros correndo depressa demais, os tapinhas nas costas que recebo dos que querem puxar o meu saco. E enquanto rola os “oh professor, gostei da sua aula”, “oh professor, o senhor é muito louco”, “oh professor o senhor é isso, o senhor é aquilo...” eu vou com o pensamento longe naquele email de adeus. Aquele adeus doído, cortante, perfurocontundente e dilacerante. Aquelas cinco letrinhas que podem mudar quando não o destino, pelo menos o dia de qualquer um. E junto vem aquela sensação de incapacidade, aquela sensação que deixa a gente com a impressão de ser o mais feio e burro do mundo. Com a impressão de ser... descartável. De não valer nada tudo o que foi feito, os esforços, os livros lidos para tentar ser minimamente culto, as benesses, os ouvidos atentos que ofereço. De nada parece valer. E assim, enquanto espero mais uma terça-feira terminar, cada vez mais sem pé nem cabeça, eu continuo aqui, ouvindo Alanis cantar "Uninvited" no meu ouvido, procurando um norte para me orientar.

Bombásticas, ácidas e causticantes

Jornal é uma coisa que deveria ser banida da face da terra. Abolida, exterminada, extirpada como se extirpa um câncer. Por isso, só vejo DVD. Porque posso escolher o que eu quero ver, e eu não gosto de ver jornal. Detesto ver minha TV pingando sangue. Principalmente sangue ruim. Daí me desce o espírito do vingador, um download do mundo espiritual direto no meu pensamento. E me vem aqueles instintos mais primitivos. Vontades latentes. Segue abaixo um trecho da lista dos condenados:

Casal Nardoni

Sentença: direto pro andar de baixo. Motivos: primeiro - covardia, segundo - burrice. Odeio burrices. Forma do extermínio: introdução de agulhas por baixo das unhas das mãos, agulhas ligadas a fios elétricos, corpo mergulhado num tambor com água até o pescoço. Voltagem 3000 volts. Tempo: 31 minutos com interrupções para descanso dos réus de 30 segundos cada interrupção .

Adimar de Jesus (de Jesus o car...)
Veredito: culpado, culpado, culpado, seis vezes culpado: Quando eu vejo bandido chorando na frente de uma câmera e pedindo desculpas, eu tenho vontade de sair dando porrada amigo. Réu que chora é culpado, quem é inocente fica indignado. Forma do extermínio: seis anos iniciais cumprindo pena. Tarefa: ser fêmea de bandido no Cepaigo. Encontrado morto. Autor da benfeitoria: Desconhecido. Principais causas: hemorragia interna, decepamento do órgão reprodutor, corte profundo na língua e queimaduras de terceiro grau na região anal.

Guilherme de Pádua
Veredito: Culpado. Motivo: Assassinato da atriz Daniela Perez. Eu era fã dela, tinha fotos dela espalhadas por todos os cadernos de sexta-série. Trauma de adolescência. Sentença: Apagar da região peniana do reu e da ré Paula (esposa), as respectivas tatuagens, utilizando solução clorídrica adicionado de ácido sulfúrico 96%.

Mas o vingador vai embora quando mostra a tão gente boa do Rio que chora seus mortos em catástrofes naturais. Uma pena que jornal só mostre coisas com conteúdo jornalístico e sensacionalista. Só assim sobe o Ibope, mostrando o Arruda saindo da prisão com aquela cara de sósia do Osama. Coitadinho. Então que seja dito as palavras do super Bruno Mazzeo depois da entrevista do apresentador Ratinho com o marginal do guilherme (g minúsculo mesmo): “pega o Ibope e enfia no...”

Tenha santa paciência

Detesto gente ignorante, gente estúpida e gente que perdeu o disconfiômetro. Meu celular toca o tempo todo de um número restrito e quando atendo é uma ex-namorada super chata querendo voltar. Odeio desinteligências. Eu tento ser atencioso e mostrar que aquilo não vai dar certo, como não deu na primeira (e ufa! graças a Deus foi a única) vez. Mas ela não percebe, não tem simancol e fica ligando o tempo todo. Liga quando estou cozinhando, quando estou dormindo, quando estou debaixo do chuveiro. E minha paciência vai chegando ao limite, a ponto de encher a tampa e o balaio e eu respiro fundo, conto até cem e faço de conta que levo na esportiva. Mas a vontade é de encarnar no personagem daquela bandida gostosa do filme “Bitch Slap” que pega a moto e encosta o pneu traseiro no rosto do traficante, trava a roda da frente, e acelera com tudo. Mas não dá pra fazer isso. Então que se dane, tchau telefone, até amanhã. Eu aproveito os últimos dias em que posso dormir até mais tarde para ficar enrolando mais um pouco na cama. Tá chovendo, e eu deixei um pouco da janela aberta, e entra aquele friozinho bom que faz a gente se enrolar no edredom e ficar olhando para o dia cinza. Palmas, gritos, campainha. Puta-que-o-pariu. Levanto xingando horrores numa altura que só eu escuto e olho pela janela. Não acredito, é a ex-namorada super chata no meu portão. Como ela sabe meu endereço se ela jamais veio aqui depois que eu me mudei? Agora que ela já me viu não dá mais pra fingir que não estou em casa. Saio enrolado no edredom e finjo estar doente. Ela enche o saco, coisa que ela sabe fazer de melhor e não dá trégua enquanto não abro aquele maldito portão. Mal entra e já vai pulando em cima querendo beijos e abraços e tudo que ela acha que ainda tem direito. Eu esquivo, começo a tossir, desvio, até que ela pergunta o que tem de errado comigo. Eu digo que nada, então ela arranca a blusa e pula mais uma vez em cima de mim e eu falo que não não e não. Então ela olha com aquela cara redonda de bolacha querendo chorar e pede para ir até o banheiro. Vou para cozinha e enquanto a cafeteira deixa o café no ponto escuto o burburinho que ela faz. Como pode existir gente tão ridícula, tão sem amor próprio? A chuva cai com tudo e a ex super chata não faz a mínima menção de ir embora, então vou até o quarto e lá está ela debaixo do meu edredom, as roupas todas jogadas pelo chão. “Cara, será que você não entende que eu não quero nada com você? Será que é tão complicado assim ou eu vou ter que fazer um desenho para você poder entender que você já não existe mais para mim?”, explodo esquecendo tudo quanto é regra de classe, esquecendo que detesto ignorâncias e estupidez. Extravaso, rodo a baiana mesmo, chuto o pau da barraca. Então ela fecha a cara, me olha com aquela fúria nos olhos já vermelhos e nada diz, apenas se levanta e como se tivesse todo o tempo do mundo, veste peça a peça sem pensar no relógio, fazendo de tudo para deixar a situação ainda mais alegre. Vai até a cozinha, acende um cigarro e se serve de uma xícara de café, que toma em dose dupla. Pega um batom vermelho sangue e escreve na minha parede: “eu volto”, bate a porta e desaparece chuva adentro.

A terceira hora

Paulo diz:
Oi tudo bem?
Bella diz:
o q vc quer?
Paulo diz:
so conversar um pouco, de onde vc é?
Bella diz:
n enche o saco
Paulo diz:
sou tão chato assim?
Bella diz:
eh
Paulo diz:
mas vc nem me conhece...
Bella diz:
nem quero, dah o fora seu chato
Paulo diz:
desculpe, so queria conversar com alguém
Bella diz:
que inferno, me deixa em paz

Paulo sai da sala...

{Matéria encontrada no jornal Gazeta de Santo Amaro – 2/4/2010}

Jovem é encontrado morto em casa
por Julio Rivera

A polícia encontrou nessa sexta-feira, dia 2, o corpo do jovem Paulo R. Santos, estudante de medicina da universidade Unip. O corpo do jovem foi encontrado em meio a caixas de remédios anti depressivos e muita bebida alcoólica. Amigos de Paulo em depoimento à polícia informaram que o jovem andava com um comportamento estranho, a todo o tempo falando em “desaparecer do mapa a qualquer momento”. O rapaz que morava sozinho em um apartamento da zona sul de São Paulo teve há poucos meses os pais assassinados de forma brutal e de acordo com colegas da faculdade, andava muito triste e isolado pelos cantos, rejeitando convites para festas e preferindo ter uma vida de ostracismo. No computador da casa de Paulo R. Santos, a polícia encontrou uma janela de bate-papo onde o mesmo havia levado um fora de uma garota, fato este que de acordo com o delegado Nunes Peçanha, da 23ª delegacia de São Paulo, pode ter ocasionado o transtorno emocional que ceifou a vida de mais um jovem. O delegado descarta a possibilidade de assassinato, e endossa a versão de que se tratou realmente de um suicídio, a partir dos fatos de que se tem conhecimento. De acordo com a perícia, o horário da morte de Paulo R. Santos é de uma hora depois do bate-papo online ter sido encerrado, por volta das duas horas da manhã. Como o jovem não tem parentes próximos e conhecidos, o IML aguardará a reclamação do corpo por parte de algum familiar distante ou amigos.

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