Próxima estação: Luz

Domingo, vinte e dois de fevereiro. Triple Two. Os convites para o teatro dali a algumas horas com a minha namorada estão sobre a cama. Tudo está arrumado, nada pode sair errado. Os candelabros já estão com as velas para o jantar de mais tarde, assim como também o vinho. Basta meu telefone vibrar para eu saber que tudo está sob controle. Finalmente o aparelho toca, mas é outra pessoa, um engano.
As horas passam, tenho que fazer alguma coisa para driblar a ansiedade. De repente, uma batida na porta, meu coração vai a quase duzentas batidas (por segundo ou por minuto?). É meu vizinho. Gasps, desatinos e blá blá blá. Preciso sair daqui. Meu telefone irá vibrar alguma hora e se estiver longe, pego um taxi e volto.
Saio sem ter a mínima noção de para onde estou indo. Minutos depois estou em frente ao Shopping Ibirapuera e entro para comprar algo para ler. Acabo comprando um Pocket Book chamado “Pretend you don’t see her” sem ter certeza que irei conseguir ler aquele livro em inglês. Saio da loja e quando vejo, estou na estação Santa Cruz. Entro no metrô e começo a ler. Tento ler, mas há um grupo de moças falando em alto volume e me perco na leitura que só vai até a página dez. Não consigo ler quando há pessoas perto falando alto, muito menos quando estou lendo em outro idioma. Desisto e guardo meu Pocket Book. Mas a história me interessa: é sobre alguém que presencia um assassinato e tem que entrar no programa de proteção a testemunhas.
“Próxima estação: Luz”, diz o condutor. Fecho o livro e desço seguindo a multidão. Só quero ir para bem longe. Entro no corredor para os trens da CPTM e resolvo ir até Ribeirão Pires sem a menor idéia do que irei fazer lá. Alguém me pede uma informação que não sei dar: sou um estranho ali. Fico preocupado. Dentro do metrô o celular não funciona, e só me resta esperar enquanto subo pelas escadas rolantes em direção à plataforma.
Eu já vi aquele lugar outra vez. Era um dos horríveis papéis de parede do famigerado Windows 98. A subida pela escada rolante está quase no fim quando meu celular vibra no meu bolso. O coração dispara. Palpitações, arrimitia, disritmia, hipertermia. Conheço aquele número. Mas a mensagem vem de outro remetente. É um recado da minha namorada contando o incidente. Leio enquanto minha boca se abre lentamente e o estômago dá voltas. Não posso acreditar no que leio. Olho e vejo o trem chegar, mas estou na plataforma errada. Se eu entrar, vou parar em Guaianazes quando deveria ir no sentido de Rio Grande da Serra.
Meu semblante cai, uma linha de expressão surge na minha testa. Dou as costas ao vagão e desço as escadas rolantes que estão paradas. Chego à base e subo outras escadas rolantes que desta vez estão funcionando. Quando chego na plataforma certa, o trem não está lá. Saiu há dois minutos, eu tinha visto.
Sento então num banco marrom e inevitavelmente uma lágrima rola pelo meu rosto. Uma daquelas bem pesadonas. Não quero mais continuar. Desço as escadarias e entro mais uma vez no metrô.
Desço na estação Sé, muito peculiar e familiar para mim. Na estação há uma clarabóia e o celular vibra mais uma vez. Temor, tremor, estado avançado do meu estupor. Leio a mensagem e olho o emaranhado de placas com suas setas. Olho para a minha esquerda e lá está o metrô que vai para o Corinthians-Itaquera. Odeio Corinthians. Em algum lugar há um alto-falante onde Michael Bublé canta “Home”. Sei que posso ir para onde eu quiser, mas tudo que quero agora, como diz a música, é ir para casa.
Perspectiva: teatro off. Pizza sozinho e filme sem sentido: On. Pizza e refrigerante: 19 reais. Filme na locadora: 4 reais. Amar ainda mais minha namorada depois daquela mensagem: Não tem preço.

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