The Landing


As poltronas dos números dezesseis a dezoito em um avião modelo Air Bus 737-400 são as piores. Ficam localizadas em cima das asas, e da janela, independente se é A ou F, a visão fica encoberta, mas é possível ver o aerofólio das asas, os flaps e parte da turbina.
Eu estava na poltrona 17F, do lado direito da aeronave, sentindo as delícias de ver o céu se unir à terra a dez mil e trezentos metros de altitude. O comandante, pelo sistema de auto-falantes dizendo que a temperatura interna era de vinte e três graus centígrados e a externa de menos quarenta graus me despertaram da leitura.
Estava lendo “O Testamento”, de John Grisham, justamente naquela parte onde o avião que ele estava foi obrigado a fazer um pouso de emergência em uma fazenda. No incidente, apenas uma baixa: uma vaca.
Em muitas vezes na minha vida eu havia observado as placas de sinalização e de avisos serem lidas e ignoradas. “Não fume”, ao redor dos fumantes, “Proibido ultrapassar”, quando há ultrapassagem, “Piso escorregadio”, visto por pessoas já no chão, “Desligue o celular”, nos postos de gasolina. Jamais ouvi ou li algo sobre algum posto de gasolina em qualquer lugar do mundo ter explodido porque alguém estava falando ao celular.
Mas ali, no vôo OR 3341 da Ocean Air, o comandando havia dito que os celulares, laptops, câmeras e tudo de eletrônico fossem desligados, pois poderia influenciar e interferir nos instrumentos do avião. A poltrona 17E estava vazia e a 17D era ocupada por uma mulher com aspecto austero e a todo momento fazia anotações e apontamentos em uma agenda. Furtivamente, ela conectou um fone de ouvido a um celular, teclou um número e quase que sussurrando, avisou a alguém que chegaria fora do horário. Nosso vôo havia atrasado quase duas horas.
A chamada ainda estava em curso quando a luz vermelha localizada acima da porta de acesso à cabine do comandante piscou e um alarme baixo, mas assustador soou. A seguir o frio na barriga quando sentimos despencar céu abaixo, perdendo altitude rapidamente segundo a segundo. As máscaras de oxigênio se soltaram do teto e assim que as pusemos, inalamos o oxigênio como se fosse o último ar do mundo.
O pânico tomou conta de todos nós e por mais que os comissários de bordo nos dissessem para ficarmos calmos, o aviso sendo efusivamente confirmado pelo comandante, tudo que queríamos era estar fora dali, com os pés firmemente plantados no chão. Ninguém queria apertar os cintos e abraçar as próprias pernas. Os estômagos de todos estavam de cabeça para baixo.
Tudo estava tremendo e tudo que eu esperava era o choque contra o chão, e depois daquilo... bem, eu não havia pensado nisso, não havia tido tempo pra pensar nisso. Pela janela, o chão ficava mais próximo a cada segundo. Não sabia o que pensar, havia um turbilhão de pensamentos na minha cabeça. E nada mais eu vi.
A aeronave, num pouso forçado, desceu em um campo limpo, sem uma árvore sequer por perto. Era um campo de trigo e no choque contra o chão, a parte de trás bateu primeiro e o avião se partiu em dois. Por um incrível milagre não explodiu.
Acordei com um corte feio na cabeça e o primeiro cheiro que pude sentir foi o de éter. As luzes brancas, muito difusas para mim, faziam médicos e enfermeiros parecerem anjos ao meu redor. Adormeci outra vez. Dois dias depois, quando minha consciência voltou, eu acordei e vi um televisor ligado num canto do quarto.
Um repórter dizia que leitura da caixa preta (que na verdade é laranja) do vôo OR 3341 havia sido feita. De acordo com a reportagem, a falha nos controles do avião foi causada por um sinal externo, muito provavelmente um celular, usado durante o vôo. A seguir, mais detalhes sobre o acidente aéreo que ceifou três vidas. Uma vez que eu sabia mais que o repórter, respirei fundo, virei para o lado e dormi mais uma vez.

1 comentários:

Meu Deus... estou na defensiva, não sei pq li este artigo. O que sei é que meu pai vai viajar de avião, ainda este mês e sinceramente estou com medo, não gosto de alturas... Agora, impressionante parece até que é manchete de algum jornal, ou um artigo da revista veja. Muito bom...

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