Goles Noturnos

Depois de dois dias sem telefone celular começo a perder as esperanças de encontrá-lo já que procurei em tudo que é lugar e nada. Nem sinal. Ligo mas a ligação nunca completa. Tenho voltado então para casa, chateado, afinal me custou uma pequena fortuna. Ontem resolvi fazer um Cosmopolitan para comemorar dois dias meio que isolado do mundo já que viramos escravos dessas geringonças eletrônicas. Termino o pouco que restou da minha vodca Absolut e fico lá no sofá, meio que sentado, meio que deitado, os pés na mesinha de centro, rodando os cubos de gelo com o indicador, vagueando entre um canal e outro tentando inutilmente encontrar algo mais agradável para assistir na TV, já que não gosto de televisão. Em meio a tanta futilidade da TV e meus goles noturnos, o telefone toca e eu conheço aquele número. É o número do meu celular. Respiro fundo e me ajeito no sofá. “Oi” ela diz depois do meu alô. Não acredito, eu reconheceria aquele oi em qualquer lugar do mundo. É a Angélica, a mulher do elevador desses dias atrás. Claro que eu fiquei desconcertado, afinal, a ficha já havia caído e eu não tinha certeza de qual seriam as nossas reações. Logo descubro que durante nosso amor meteórico no elevador sem energia, meu aparelho acabou parando na bolsa dela. Então ela me pergunta quando posso ir buscar, ou ela trazer para mim. Temos que marcar uma data e um lugar. “Quando você pode?” eu pergunto e ela muito direta responde: “que tal agora?”. E em exatos trinta e três minutos toca minha campainha, e eu mal tive tempo de me arrumar. E quando o dia começa a clarear, olhamos um para o outro e prometemos manter o pacto de não saber nada um sobre o outro. Nada que faça a gente se apegar, se gostar e se apaixonar. E como algumas coisas não tem explicação, apenas respiro fundo enquanto eu a vejo se vestir, levantar e sair, sem um olhar, sem um beijo ou um abraço. Apenas uma marca de batom no visor do celular. E eu acho que jamais irei rever a Angélica. Nem ligar a televisão em tarde de sábado para não ter que relembrar a mulher do elevador.

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